sábado, 24 de janeiro de 2015

Capítulo VI


   Enquanto caminhava sem saber exatamente para onde, na tentativa de encontrar algum sinal que a levasse para perto da cidade, no céu surgiu uma espécie de submarino gigante. Boquiaberta, a Pequena Ladra parou e ficou olhando aquele monstro que rasgava o céu.
   Quando se deu por conta, seguia o trajeto que o balão a vapor fazia. E só teve tal percepção justamente por ter se deparado em frente a um casarão antigo, de paredes de pedras esgarçadas pelo tempo. Precisava passar por ele para seguir o seu caminho... Ou melhor, aquele que o balão lhe indicava, como um sinal.
   Sentiu cheiro de carne podre e teve medo. De repente, ouviu um estalido e percebeu que uma mulher muito nova, de cabelos negros soltos e vestido branco, se arrastava pela frente da casa. A Pequena Ladra deitou-se no chão, atrás de uma árvore, querendo se esconder. Alguma coisa muito estranha acontecia ali, mas não queria saber o que era. Queria encontrar o Cego da Cartola.
   Viu, então, que aquela dama estava ferida, pois mancava a perna direita. Ela rezava baixo, com as mãos unidas, apertando os nós dos dedos ao mesmo tempo. Parou por um segundo e virou-se, na sensação de estar sendo observada. Afastando as mãos, e sem perceber, deixou cair uma de suas pulseiras do pulso esquerdo.
   A Pequena Ladra esperou aquela criatura recompor de sua desconfiança e se arrastar para dentro de uma das portas da casa para desaparecer, trazendo um silêncio ensurdecedor naquele ambiente. Assim que pôde, a mocinha levantou-se, pegou a pulseira e pôs-se a correr, a fim de recuperar o tempo perdido. Foi quando se encontrava suficientemente longe daquele casarão com tantos segredos que escutou um grito forte e estridente. Compreendeu: aquele lugar era o qual carregava em seus sonhos, aquele que seu palato fazia questão de lhe entregar em gosto de sangue.
   Correu com mais vontade para ficar cada vez mais distante. Agora já sabia que era questão de tempo até a Mulher Ruiva encontrá-la e dizer o seu nome novamente. Correu até cansar e, depois disso, andou até entardecer. Jamais saberia que estava próxima à cidade se não tivesse conseguido distinguir o piscar das luzes dos lampiões. Nesse momento, finalmente, parou para olhar - com curiosidade e paciência - a pulseira que roubara: era dourada e trazia presa em si duas chaves: uma grande, comprida e cor de estanho; outra pequena, delicada e dourada.

   Estava no lugar certo, mas não poderia ficar.

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