Ao entardecer, as lamparinas
começavam a acender suas luzes fracas em torno dos trilhos abandonados. Tudo o
que era movimento acabou por se esconder atrás do matagal alto e amarelado para
manter a sobrevivência naquele lugar.
Nem tão longe dali, pequenas casas seguiam o trajeto acompanhando a via férrea. Certamente houveram moradores ali, mesmo que já não fossem tão visíveis... Pelas janelas engorduradas, flores murchas em tarros de água suja. Trancas. Correntes. O desespero de perder o nada.
Nem tão longe dali, pequenas casas seguiam o trajeto acompanhando a via férrea. Certamente houveram moradores ali, mesmo que já não fossem tão visíveis... Pelas janelas engorduradas, flores murchas em tarros de água suja. Trancas. Correntes. O desespero de perder o nada.
Do outro lado, o barulho dos
cascalhos sendo maltratados pelo pisar grosso das botas da Pequena Ladra que
chegava. Os bolsos tilintando o choque das chaves roubadas na vila. Os olhos
roxos lhe denunciavam o que havia feito. Quarenta e seis. Era considerado pecado. Continuaria fazendo.
Os lagartos cruzavam seu caminho e só então ela sorria. Eles eram iguais ela, mas com um propósito diferente. Cada um rouba o que bem entende pela importância que quer dar.
Os lagartos cruzavam seu caminho e só então ela sorria. Eles eram iguais ela, mas com um propósito diferente. Cada um rouba o que bem entende pela importância que quer dar.
A Pequena Ladra não tinha
uma casa, mas tinha a chave da casa dos outros. Ela poderia adormecer na cama
de quem quisesse, mas preferia a terra que viria a umedecer-se pelo orvalho. Também não podia se
permitir pensar no que abandonara: o dia seguinte não lhe traria algodão-doce
em terra de circo. O dia seguinte deveria lhe dar chaves.
Ouviu o grito estridente de
sacrifício ao longe. Foi o suficiente para que travasse o andar e fechasse os olhos. Visualizou
a lâmina deslizando funda pela pele fresca. Do queixo ao umbigo. A escuridão aparecendo
em gotas encarnadas para o mundo. O cheiro doce de sangue.
Salivou.
Hesitou o silêncio, para que o vento trouxesse, por trás dela, uma voz feminina sussurrando seu nome.
Hesitou o silêncio, para que o vento trouxesse, por trás dela, uma voz feminina sussurrando seu nome.
E quando alguém acertava o
seu nome, era hora de partir.
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